Tuesday, June 26, 2007

Postcard from Africa

Sangano, February 13th, 2007.

Darling,

If only I was a good writer to let you know what’s happening, make videos to share with you some of the beauty with which my days are filled, record a tape for you to listen the same sounds I do everyday. How I wish there was a way of letting you have some of this easily since I can’t have you here with me…

I want to tell you about the times when my breathing stops for some seconds, mostly at dusk, whenever I’m more aware of those fragile and beautiful moments and of how they won’t return to me that same way. It’s been happening to me frequently, you know? Maybe you feel the same there, and I do hope you let me know the next time I hear from you.

Frequently I caught myself staring at the waves at sunset, as seabirds fly in circles over them in search for food, and it’s like being in a trance. Immediately after I always feel your absence, every-time the same feeling. Only then I remember we’re under the same sky, we simply see it from different perspectives, like two lighthouses over the same wide bay, each of us keeping his eye on a same distant horizon.

Miss you.

Yours always.

(Photography: Sangano, Angola, February 13th, 2007 / Text: Coimbra, Portugal, June 26th, 2007)

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Monday, June 25, 2007

Anunciação de um sonho

Quando o dia esperado finalmente chegar prometo fazer rápido as minhas bagagens para que ninguém sinta para além de mim o peso da decisão que tomo. Espera-me a Terra, esse mundo tantos anos desejado e visitado em delírios de febre. Um mundo tão cheio de pesadelos e de sonhos por realizar e que aprendi a amar ao ponto de não conseguir concebê-lo sem que uma poderosa mão invisível me aperte o estômago e me rasgue de dentro para fora. Um mundo elástico que ao longo dos anos se foi esticando para chegar até mim e tocar-me sempre, como uma mãe procurando manter acesa num filho uma lembrança distante.

Quero sentir de manhã cedo o avião a perder altitude, olhar a janela e ver os milhares de casas sobre a terra vermelha salpicada de verde e minutos depois sair e deixar as saudades envolverem-se com a humidade da pista do aeroporto. Quero sentir de novo a emoção que senti e que foi maior que qualquer outra coisa que algum dia senti nesta vida. Estive vivo por um período limitado de tempo. Quero sair e ver rostos conhecidos à minha espera, de sorriso largo e braços abertos para me acolherem na minha nova vida na Terra onde naquele dia distante vim a este mundo e espreitei a existência. E quero encontrar em cada um desses rostos que me olhem, em cada mão que me toque, em cada palavra que me digam, novas e novas razões para ficar na Terra para nunca mais sair.

Quando o dia chegar as saudades que sempre serão minhas e de mais ninguém não ocuparão volume na bagagem. Levá-las-ei comigo para onde for, e serão sempre essas imagens preciosas que desenharei na areia e a quem brindarei quando erguer um copo. Há lugar para tudo, e um tempo também. Mas a atracção que sinto há muito já que decidiu por mim o que havia a decidir, e a cada dia que passa me é mais insuportável viver afastado da Terra. Viver longe não é viver.

Acho que sei a falta que me vão fazer certas pessoas, certas coisas, a minha cadela companheira... Acho, porque a certeza apenas a terei quando ao fim de algum tempo parar para pensar no que tenho, no que tive um dia, e no que sobra de mim nesta complexa equação. Apenas a ideia dessa perda faz já sofrer, e se ainda assim desejo viver o regresso à Terra é porque não tenho dúvidas de que seria bem maior a dor de não regressar mais, de não procurar viver até onde me for possível este sonho que tenho desde criança de abraçar uma realidade que nunca me deixou independentemente de eu não o conseguir explicar. A perda seria bem maior, talvez insuperável, porque do lado de cá da viagem, deste lado onde me encontro à espera, uma certa loucura vai tomando conta de mim dia após dia. Espero que aqueles que têm de compreender, para quem isto faça sentido, compreendam a necessidade que sinto de seguir este percurso. Preciso da vida, e este nunca foi o meu habitat.

A imaginação é inerente à natureza humana, e no fundo talvez eu sempre tenha sido a pessoa mais feliz de todas aquelas que conheço, pois o meu maior sonho sempre foi algo que esteve ao meu alcance, e que agarrei já – regressar à Terra. Quero agora regressar de novo para viver diariamente esse sonho pelo resto da minha vida, ou enquanto me for possível vivê-lo, pois estou certo de que todas as imagens que me irão preencher me irão acompanhar para sempre e acalmar-me deste medo da morte que trago desde criança. Estou certo de ali ir encontrar razões para seguir em frente e viver um outro dia, ideais nos quais consiga acreditar sem esforço, ainda que os desafios que diariamente se nos coloquem não sejam os mesmos a que sempre estive habituado. Preciso de uma causa que me faça lutar.

Quero aprender a viver de coisas simples, ver o mundo como se fosse cego, experimentar sensações reais e deixar este teatro que diariamente faço faz muitos anos já. Comer quando tiver fome, beber quando tiver sede, vestir o que tiver mais à mão, conversar no calor da noite até de madrugada sempre que o assunto for bom, regressar a casa com a cidade a acordar e o trânsito a invadir as ruas, acordar com o canto das peixeiras na Mutamba, revisitar velhos amigos sempre que possível, entrar num grupo e cantar, assar peixes na brasa de noite bebendo uma Cuca a estalar, sentir uma mão aninhada na minha, talvez ser pai um dia... Se tudo isto eu irei ou não conseguir não sei, mas caso o consiga poderei sorrir de verdade, pois fiz da minha vida o sonho que sempre desejei que ela fosse. O meu maior sonho é simples. E assim, quando deitar a cabeça na areia ou entrar no mar de água tépida não me esquecerei jamais de ninguém, pois na minha felicidade os reinventarei a todos, mesmo quando o passado for definitivamente passado e não algo de que ainda se vê o vulto no horizonte. Até muito breve mamã.

(Fotografia: Luanda, Angola, 11 de Fevereiro de 2007 / Texto: Coimbra, Portugal, 25 de Junho de 2007)

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