Thursday, April 17, 2008

Náufragos de margens e de sinais


Hoje foi como ontem e amanhã logo se vê. A chuva continua a cair aqui com uma cadência monótona e irritante. Sinto-a como parte fundamental de um plano maquiavélico para me enlouquecer. Cai lá fora, na rua, mas sinto-a cair dentro do meu quarto deixando-me atolado em lama e frio. Tenho uma mala para preparar para fugir uns dias para um país mais quente e não sinto vontade. Os dias de hoje e de ontem paralisam-me o desejo de fuga, a apetência pela viagem, o gosto dos preparativos. Se viajar fosse sexo desta vez não me interessam os preliminares.

A mala está aberta sobre a cama mas as roupas nem sequer aqui estão perto. O vento deve tê-las espalhado pelas ruas, pelas redondezas, e de certeza por esta altura algum animal sem dentes há-de estar a considerar a melhor forma de vestir umas meias minhas em braços escanzelados. Amanhã logo se vê, mas hoje foi como ontem, e o tecto do meu quarto desapareceu e chove cá dentro deixando-me tremendo de frio num lamaçal. Não me apetece nada. E porém, por vezes foco o olhar num ponto sem interesse qualquer e enquanto me deixo levar por um túnel de luzes não muito fortes e de contornos imprecisos penso em Istambul. Abstraio-me de uma Coimbra náufraga de margens. Uma Coimbra à deriva num mar de nuvens cinzentas prenhes de vagas violentas. Traz um rombo esta cidade, e mete água a um ritmo que já não dá grande margem à esperança da tripulação. Adeus sítio…

Por vezes ouço alguém falar e surpreendo-me. Falam, estes animais estranhos! E porque não haveriam de falar? Pedem talvez ajuda, uma tábua que lhes permita flutuar pelos dias de chuva até uma margem menos distante do rio. Que sirva para algo mais útil do que registar mandamentos! Seguir de olhos fechados os contornos dos caminhos maternos até ao parto e a uma toalha seca que os embrulhe e os leve para sempre do frio. Amanhã logo se vê se busco a roupa para a enfiar dentro da mala, mas com este som de milhares de gotas gordas que caem do mar em cima de mim e para a caleira metálica acabo por me deixar sair do corpo e imaginar o Bósforo. Tenho sede de climas mais secos. Preciso de sentir o sol apagar, como uma borracha, as minhas rugas e olheiras de tantos dias de mar. Neste país não há tornados! Apenas construções de fraca qualidade feitas por homenzinhos tristes com a sua escolaridade obrigatória. Desculpem o desabafo aqueles que confeccionam e cozem a broa que vou mastigando diariamente com o olhar perdido na chuva lá fora. Só broa e chuva já não bastam. Preciso de um futuro onde um sol possa brilhar.

(Fotografia: Coimbra, Portugal, Setembro de 2007 / Texto: Coimbra, Portugal, 17 de Abril de 2008)

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Monday, April 14, 2008

Outgrow me


Go now. Start your long planned journey around life – around both our lives. Try this world and what it has to offer you, and keep the best. Check new places with untouched landscapes and feel the wind. Try strange foods and tell me latter how it was. Speak with the peoples and try to understand what it is they really want, how they feel about things. Go north and go south. Bathe in crystal clear waters shinning brightly under the sun, and fell the murdering cold of extreme latitudes. Just go. Don’t waste time packing too much things you won’t ever need anyway. Close your eyes at dusk, away from here, and just think of who you are, where you are and what you’re doing. You’ll be living our entire dream baby! Fell the smells of Africa. Hear the roar of Europe. Go east and go west. Capture the colours of flowers and always bring some in your hands. Put them inside the book I gave you, to mark pages I never had the chance to read, and close it tightly. Go and see everything, go and do everything. Be everything you can be! Just grow and grow, far above what they made us believe we were – maybe there were hardly any constraints for us, all being part of the monstrous lie in which we’ve lived both our lives. Now you go and do it, grow. Outgrow me and the life we’ve led, it will only get better. I’ll be waiting for you and for all those stories. I know you’ll tell me all about it one day when we’ll rejoin and open the book together. I will never doubt it. Not just for a second. I will be here, thinking about you enjoying your life and those wonderful experiences, as if you were going to feel my hands forever in your hair.

(Photography: Porto, Portugal, 2006 / Text: Coimbra, Portugal, April 14th, 2008)

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